quarta-feira, 25 de novembro de 2009

A cerca da pessoa Jurídica I




Segundo Maria Helena Diniz, pessoa jurídica é a unidade de pessoas naturais, essencialmente gregárias, ou patrimônios, que visa a consecução de certos fins, reconhecida pela ordem jurídica como sujeito de direitos e obrigações. Cunha Gonçalves defini-la como sendo "associações ou instituições formadas para realização de un fim e reconhecidas pela ordem jurídica como sujeito de Direito."
Basicamente, duas correntes podem ser vislumbradas: a teoria negativista ( Marcel Planiol), que ao negar a existência concreta das pessoas jurídicas, nelas vislumbra, apenas, um patrimônio sem sujeito; e a teoria afirmativista, partindo do pressuposto da existência real de grupos sociais com interesses próprios, os quais não poderiam deixar de ser enxergados e aos quais o ordenamento jurídico não poderia negar a qualidade de sujeito nas relações jurídicas.
O grande pecado da teoria negativista foi confundir a pessoa jurídica( que exerce atividades autônomas e pessoalmente) com os bens que possuía. Assim prevalece, entre nós e nos ordenamentos civis hodiernos, a tese afirmativista, sendo esta a opção do legislador de 2002, como se infere da interpretação do art. 47 da lei civil.
Dentre os afirmativistas, alguns justificam a personalização dos grupamentos humanos ou das destinações patrimoniais através da criação arbitrária da lei ( teoria da ficção), enquanto outros preferem fundar seus motivos na realidade social ( teoria da realidade)
Apesar de não haver um consenso entre a grande variedade de doutrinas é possível agrupá-las em quatro categorias:1) teoria da ficção lega e da doutrina; 2) teoria da equiparação; 3) teoria orgânica; 4) teoria da realidade das instituições jurídicas.
A teoria da ficção legal, de Savigny, ao entender que só o homem é capaz de ser sujeito de direito, concluiu que a pessoa jurídica é uma ficção legal, ou seja, uma criação artificial da lei para exercer direitos patrimoniais e facilitar a função de certas entidades. Vareilles- Sommières varia um pouco esse entendimento, ao afirmar que a pessoa jurídica apenas tem existência na inteligência dos juristas, apresentando-se como mera ficção criada pela doutrina.
Não se pode aceitar esta concepção, que, por ser abstrata, não corresponde  à realidade, pois se o Estado é uma pessoa jurídica, e se, se concluir que ele é ficção legal ou doutrinária, o direito que dele emana também o será.

A teoria da equiparação, defendida por Windscheid e Brinz, entende que pessoa jurídica é o patrimônio equiparado no seu tratamento jurídico às pessoas naturais. É inaceitável porque eleva os bens à categoria de sujeito de direitos e obrigações, confundindo pessoas com coisas.
Pela teoria da realidade objetiva ou orgânica, de Gierke e Zitelmann, há junto às pessoas naturais, que são organismos físicos, organismos sociais constituídos pelas pessoas jurídicas, que têm existência e vontade própria, distinta da de seus membros, tendo por finalidade realizar um objetivo social. Entretanto essa concepção recai na ficção quando afirma que a pessoa jurídica tem vontade própria, porque o fenômeno volitivo é peculiar ao ser humano e não ao ente coletivo [MHD]. A crítica que lhe faz é que ela não esclarece como os grupos sociais, que não têm vida própria e personalidade, que é característica do ser humano, podem adquirí-la e se tornarem sujeitos de direitos e obrigações. A demais reduz o papel do Estado a mero conhecedor de realidades já existentes, desprovido de maior poder criador [Gonçalves p.185].
A teoria da realidade das instituições jurídicas, de Hauriou admite que há um pouco de verdade em cada uma dessas concepções. Como a personalidade humana deriva do direito(tanto que este já privou seres humanos de personalidade- os escravos p. ex.), da mesma forma ele pode concedê-la a agrupamentos de pessoas ou de bens que tenham como escopo a realização de interesses humanos. A personalidade jurídica é um atributo que a ordem jurídica estatal outorga a entes que o merecerem. Logo, essa teoria é a que melhor atende à essência da pessoa jurídica, por estabelecer, com propriedade, que a pessoa jurídica é uma realidade jurídica.[MHD,p.233]. Segundo Gonçalves, merece a mesma crítica feita à teoria anteriormente comentada. Nada esclarece sobre as sociedades que se organizam sem a finalidade de prestar um serviço ou preencher um ofício, nem sobre aquelas infesas ao poder autonormativo do grupo, como as fundações, cuja constituição decorre fundamentalmente da vontade do instituidor.[Gonçalves;p.185]
Gonçalves separa as diversas teorias afirmativas existentes em dois grupos: o das teorias da ficção e o das teorias da realidade.  A primeira é composta pela teoria da "ficção legal" de Savigny (já exposta no parágrafo anterior) e a teoria da "ficção doutrinária" que seria uma variação da anterior e tem como adepto Varreilles-Sommières ( também já explicitada anteriormente). A segunda, a teoria da realidade diverge os seus adeptos apenas no modo de apreciar essa realidade, dando origem a várias concepções, dentre as quais se destacam as seguintes: a) Teoria da realidade objetiva ou orgânica;  b) Teoria da realidade jurídica ou institucionalista ( já mencionadas no parágrafo precedente) e c) a teoria da realidade técnica na qual entendem seus adeptos, especialmente Saleilles e Cilin Capitant, que a personificação dos grupos sociais é expediente de ordem técnica, a forma encontrada pelo direito para reconhecera existência de grupos de indivíduos, que se unem na busca de fins determinados. A personificação é atribuída a grupos em que a lei reconhece vontade e objetivos próprios. O Estado, reconhecendo a necessidade e a conveniência de que tais grupos sejam dotados de personalidade própria, para poder participar da vida jurídica nas mesmas condições das pessoas naturais, outorga-lhes esse predicado.
A personalidade jurídica é, portanto, um atributo que o Estado defere a certas entidades havidas como merecedoras dessa benesse. O Estado não outorga esse benefício de maneira arbitrária, mas sim tendo em vista determinada situação, que já encontra devidamente concretizada, e desde que se observem determinados requisitos por eles estabelecidos.
Malgrado a crítica que se lhe faz, de ser positivista e, assim, desvinculada de pressupostos materiais, segundo Gonçalves, é a que melhor explica o fenômeno pelo qual um grupo de pessoas, com objetivos comuns, pode ter personalidade própria, que não se confunde com a de cada um de seus membro se, portanto, a que melhor segurança oferece. É a teoria adotada pelo direito brasileiro, como se depreende do art. 45 do código civil, que disciplina o começo da existência legal das pessoas jurídicas de direito privado, bem como dos arts. 51, 54,VI; 61;69 e 1033 do mesmo diploma.

Pode-se dizer, segundo Gonçalves, que são quatro os requisitos para a constituição da pessoa jurídica: a) vontade humana criadora ( intenção de criar uma entidade distinta da de seus membros); b) elaboração do ato constitutivo ( estatuto e contrato social); c) registro do ato constitutivo no órgão competente; d) liceidade de seu objetivo.
A vontade humana materializa-se no ato de constituição, que deve ser escrito. São necessárias duas ou mais pessoas com vontades convergentes, ligadas por uma intenção comum ( affectio socitatis). O ato constitutivo é requisito formal exigido pela lei e se denomina estatuto, em se comum (affectio societatis).

O ato constitutivo é requisito formal exigido pela lei e se denomina estatuto, em se tratando de associações, que não têm fins lucrativos; contrato social, no caso de sociedades, simples ou empresárias, antigamente denominadas civis e comerciais; e escritura pública ou testamento, em se tratando de fundações. ( CC, art.62)
O ato constitutivo deve ser levado a registro para que comece, então, a existência legal da pessoa jurídica de direito privado. ( CC, art 45). Antes do registro, não passará de mera " sociedade de fato" ou de " sociedade não personificada", equiparada por algum nascituro, que já foi concebido mas que só adquirá personalidade se nascer com vida. No caso da pessoa jurídica, se o ato constitutivo for registrado.

A liceidade de seu objetivo é indispensável para a formação da pessoa jurídica. deve ele ser, também, determinado e possível. Nas sociedades em geral, civis ou comerciais, o objetivo é o lucro pelo exercício da atividade. Nas fundações os fins só podem ser religiosos, morais, culturais, ou de assistência ( CC, art 62, parágrafo único). E nas associações, de fins não econômicos (art,53), os objetivos colimados são de natureza cultural, educacional, esportiva, religiosa, filantrópicas, recreativa, moral etc. Objetivos ilícitos ou nocivos constituem causa de extinção da pessoa jurídica ( art, 69)
A existência das pessoas jurídicas de direito público decorre, todavia, de outros fatores, como a lei e o ato administrativo, bem como de fatos históricos, de previsão constitucional e de tratados internacionais, sendo regidas pelo direito público e não pelo código.

De acordo com Gagliano e Pamplona,  a existência legal, no sistema das disposições normativas, exige a observância da legislação em vigor, que considera indispensável o registro para aquisição de sua personalidade jurídica.
Neste sentido, a análise do art.45 do CC-02 ( art. 18 do CC-16), já transcrito, permite a conclusão de que a inscrição do ato constitutivo ou do contrato social no registro competente- junta comercial, para as sociedades mercantis em geral. Cartório de Registro Civil de pessoas jurídicas, para as fundações, associações e sociedades civis- é a condição indispensável para atribuição de personalidade à pessoa jurídica.Lembre-se, todavia, de que, em alguma hipóteses, exige-se, ainda, autorização do poder executivo para seu funcionamento.
E, se assim é, observa-se que o registro da pessoa jurídica tem natureza constitutiva, por ser atributivo de sua personalidade, diferentemente do registro civil de nascimento da pessoa natural, eminentemente declaratório da condição de pessoa, já adquirida no instante do nascimento com vida.

Seguindo a diretriz normativa do Novo Código Civil, o registro declarará ( art. 46):
a) a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social, quando houver.;
b) o nome e a individualização dos fundadores ou instituidores e doa diretores.
c) o modo por que se administra e representa, ativa e passivamente , judicial e extrajudicialmente;
d) se o ato constitutivo é reformável no tocante à administração, e de que modo;
e) se os membros respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais;
f) as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu patrimônio, nesse caso.
Para o registro, dispõe o art. 121 da Lei de Registros Públicos : " serão apresentadas suas vias do estatuto, compromisso ou contrato, pelas quais far-se-á o registro mediante petição do representante legal da sociedade, lançando o oficial, nas duas vias, a competente certidão do registro, com o respectivo número de ordem, livro e folha. Uma das vias será entregue ao representante e outra arquivada em cartório, rubricando o oficial as folhas em que estiver impresso o contrato, compromisso ou estatuto".
para alguns tipos de pessoas jurídicas, independentemente do registro civil, a lei, por vezes, impõe o registro em algum outro órgão, com a finalidade cadastral e de reconhecimento com validade de atuação, como é o caso dos partidos políticos, que na forma do §2 do art. 17 da constituição federal e dos parágrafos do art. 7 da Lei n. 9096, de 19 de setembro de 1995, devem ser inscritos no Tribunal Superior Eleitoral.
Da mesma forma, as entidades sindicais obtêm personalidade jurídica com o simples registro civil, mas devem comunicar a sua criação ao Ministério do Trabalho, não para efeito de reconhecimento, mas sim, simplesmente , para controle do sistema de unicidade sindical, ainda vigente em nosso país, conforme o art. 8 I e II, da CF de 1988.

Sem o registro de seu ato constitutivo a pessoa jurídica será considerada irregular, mera associação ou sociedade de fato, sem personalidade jurídica, ou seja, mera relação contratual disciplinada pelo estatuto ou contrato social.
Efetivado o registro, porém, a pessoa jurídica começa a existir legalmente, passando a ter aptidão para ser sujeito de direitos e obrigações e a desfrutar de capacidade patrimonial, como vida própria e patrimônio que não se confunde com o de sues membros. A regularização da sociedade de fato, com o registro do seu ato constitutivo, não produz, todavia, efeitos pretéritos, não retroagindo estes ao período anterior , em que permaneceu como sociedade de fato. Aplicam-se lhe nessa fase os princípios reguladores da sociedade irregular.
 O novo Código Civil  disciplina a sociedade irregular ou de fato no livro concernente ao Direito de Imprensa, como " sociedade não personificada". Dispõe, inicialmente, o art. 986 do referido diploma: "Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a sociedade, exceto por ações em organização, pelo dos posto neste capitulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele forem compatíveis, as normas da sociedade simples". Tal regra aplica-se também às associações que já exercem atividades não lucrativas mas ainda não tem existência legal.
Por sua vez, dispõe o art. 990 do código Civil que todos " os sócios respondem solitária e ilimitadamente pelas obrigações sociais".  O referido dispositivo exclui aquele, que contratou pela sociedade, do benefício de ordem previsto no art. 1024, segundo o qual os bens particulares dos sócios não poderão ser executados por débitos da sociedade, senão depois de executados os bens sociais. Esses dispositivos mereceram de Fábio Ulhoa Coelho o comentário de que " todos os sócios da sociedade empresaria irregular deveriam ser responsabilizados pelas obrigações sociais de forma direta, não se exigindo dos credores sociais o anterior exaurimento do patrimônio dela. Ocorre  que a lei trata diferentemente os sócios da sociedade empresária, enquanto não regularizado o registro , atribuindo responsabilidade subsidiária à generalidade dos sócios e direta somente ao que se apresentar como seu representante ( CC/2002, arts. 989 e 990). Observe-se que, na sociedade registrada regularmente, a responsabilidade dos sócios será sempre subsidiária , mesmo que ilimitada. Isto é, tirante a do sócio que atua como representante da sociedade empresária irregular, em todas as demais situações a regra é subsidiariedade".

O patrimônio das sociedades não personificadas responde pelas obrigações, mas os seus sócios têm o dever de concorrer com seus haveres, na dívida comum, proporcionalmente a sua entrada. (CPC, art 596). A responsabilidade incidente sobre o acervo repercute no patrimônio dos sócios, confundindo-se os direitos e obrigações daquelas com os destes.
Os sócios, nas relações entre si ou com terceiros, apenas poderão provar a existência da sociedade por escrito, mas "aos terceiros será permitida a utilização de qualquer meio de prova” (CC, art. 987). Os bens  sociais respondem pelos atos da gestão praticados por qualquer dos sócios, exceto se houver sido celebrado pacto limitativo de poderes, que somente terá eficácia contra  terceiro, no entanto, se este o conhecer ou devesse conhecê-lo. ( art 989)

Prescreve o ar. 12, VII, do CPC que serão representadas em juízo, ativa e passivamente, "as sociedades sem personalidade jurídica, pela pessoa a quem couber a administração dos seus bens". Têm legitimidade, pois, para cobrar em juízo os eus créditos, não podendo o devedor argüir a irregularidade de sua constituição para se furtar ao pagamento   da dívida e , assim, enriquecer-se ilicitamente.
Não obstante, por não serem sujeitos de direitos, não podem em seu nome, figurar como parte em contrato de compra e venda de imóvel, nem praticar atos extrajudiciais que impliquem alienação de imóveis, por que o Registro Imobiliário não poderá proceder ao registro.
É competente "para a ação em que for ré a sociedade que carece de personalidade jurídica"  o foro do lugar " onde exerce a sua atividade principal." (CPC, art. 100, IV,c) [Gonçalves, p.  191]. Além da irregularidade do registro ( que possibilita a construção de teorias sobre as sociedades de fato), o campo das relações sócio-jurídica é amplo demais para que o instituto da pessoa jurídica abarque todas as formas possíveis de manifestação coletivas destinadas a um fim.
Neste sentido, observa  Maria helena Diniz que há entidades que não podem ser submetidas ao regime legal das pessoas jurídicas do código civil, por lhes faltarem requisitos imprescindíveis a subjetivação, embora possa agir, sem maiores dificuldades, ativa ou passivamente. São entes que se formam independentemente da vontade de seus membros ou em virtude de um ato jurídico que vincula as pessoas físicas em torno de bens que lhes suscitam interesses, se lhes traduzir affectio socitatis. Donde se interfere que os grupos despersonalizados ou com personificação anômala constituem um conjunto de direitos e obrigações, de pessoas e de bens sem personalidade jurídica e com capacidade processual, mediante representação.

Sobre a matéria, dispõe o vigente CPC brasileiro: 
" Art. 12. Serão representados em juízo, ativa ou passivamente:
I-a União, os Estados, o Distrito Federal e os territórios, por seus procuradores.;
II- o Município pelo seu prefeito ou procurador;

III- a massa falida , pelo síndico;
IV- a herança jacente ou vacante, pelo seu curador;
V- o espólio, pelo inventariante;
VI- as pessoas jurídicas , por quem os respectivos estatutos designarem, ou , não os designando, por seus diretores;
VII- as sociedades sem personalidade jurídica, pela pessoa a quem couber a administração do seus bens.
VIII- a pessoa jurídica estrangeira, pelo gerente, representante ou administrador de sua filial, agência ou sucursal aberta ou instalada no Brasil ( art. 88, parágrafo único);
IX- o condomínio pelo administrador ou pelo síndico"
Sendo tais grupos despersonalizados apenas um conjunto de direitos e obrigações, pessoas e bens, sem personalidade jurídica, qualquer enumeração feita será sempre explicativa, e jamais taxativa, até mesmo porque o inciso VII do art. 12 admite interpretação extensiva.
Explicando, ainda que a à vol d'oiseau, os exemplos trazidos pela norma processual, a massa falia é um conjunto patrimonial, criado pela lei, para exercer os direito do falido, podendo agir, inclusive, contra ele. Surge com a prolação da sentença declaratória de falência, que importa na perda do direito à administração e à disposição dos bens pelo devedor.
As heranças jacentes e vacante são institutos de Direito das Sucessões, tratados nos arts. 1819  1823 do CC-02, sendo a primeira considerada o acervo patrimonial deixado pelo de cujus, sem testamento ou herdeiro legítimo notoriamente conhecido, que deverá ser arrecadado, ficando sobre a guarda e administração de um curador, até a sua entrega ao sucessor devidamente habilitado ou à declaração de sua vacância. Esta se declara quando, praticadas todas as diligências de arrecadação e ultimado o inventário, com expedição de editais na forma da lei processual, bem como decorrido um ano de sua primeira publicação, não haja herdeiro habilitado ou penda habilitação.

Já o espólio é o simples conjunto de direitos  e obrigações do falecido, ou seja, apenas uma massa patrimonial deixada pelo autor da herança, que se constitui ipso facto com o advento de seu desaparecimento.
A sua administração e representação cabe, como já visto, ao inventariante, mas, antes da sua nomeação judicial, o espólio - que, repita-se , deve ser entendido como constituído desde o evento morte - continuará na posse do administrador provisório, na forma do art. 985 do CPC. O CC-02, em seu art. 1797, estabelece a seguinte ordem para a administração provisória:
I- ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da sucessão.
II- ao herdeiro que estiver na posse  e administração dos bens, e , se houver mais de um nessas condições , ao mais velho;

III- ao testamenteiro;
IV- a pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das indicadas nos incisos antecedentes , ou quando tiverem de ser afastadas por motivo grave levado ao conhecimento do juiz.
Finalmente o condomínio possibilita a titularidade coletiva de determinado bem, cabendo a qualquer dos co-proprietários igual direito sobre o todo e cada uma das partes ( arts. 623 a 646 do CC-16). O CC-02 inovou, inclusive, a matérias, trazendo para o texto geral codificado disciplina  tanto para o condomínio em geral ( arts. 1314 a 1330)quanto para o condomínio edilício ou horizontal ( arts. 1331 a 1358). Em termos de administração, a regra da primeira forma de condomínio é a deliberação da maioria, admitida, porém , uma outorga tácita de poderes, enquanto, nas edificações, conforme regra imperativa do art. 1347, a "assembléia escolherá um síndico, que poderá não ser condômino, para administrar o condomínio, por prazo  não superior a dois anos, o qual poderá renovar-se". [Gagliano & Pamplona].

A capacidade é decorrência lógica da personalidade atribuída à pessoa. Se, por um lado, a capacidade para a pessoa natural é plena, a capacidade da pessoa jurídica é limitada à finalidade para a qual foi criada.
Os poderes outorgados à pessoa jurídica estão delimitados nos atos constitutivos, em seu ordenamento interno (contrato social, estatutos), bem como delimitados pela lei, porque os estatutos não podem contrariar normas cogentes, quando a atuação de determinadas pessoas jurídicas é autorizada ou fiscalizada (em sentido estrito) pelo Estado. Há restrições de ordem legal, por vezes impostas pelo Estado, que obrigam a certo controle estatal. É o que ocorre entre nós, por exemplo, no tocante às instituições financeiras.
Assim, uma vez registrada a pessoa jurídica, o Direito reconhece-lhe a atividade no mundo jurídico, decorrendo daí, portanto, a capacidade que se estende por todos os campos do Direito e em todas as atividades compatíveis com a pessoa jurídica.
A pessoa jurídica tem sua esfera de atuação ampla, não se limitando sua atividade tão-somente à esfera patrimonial. Ao ganhar vida, a pessoa jurídica recebe denominação, domicílio e nacionalidade, todos atributos da personalidade.
Como pessoa, o ente ora tratado pode gozar de direitos patrimoniais (ser proprietário, usufrutuário etc.), de direitos obrigacionais (contratar) e de direitos sucessórios, já que pode adquirir causa mortis.
Como, no entanto, a pessoa jurídica sofre limitações ditadas por sua própria natureza, não se equipara à pessoa física e não pode inserir-se nos direitos de família e em outros direitos exclusivos da pessoa natural, como ser humano. Doutro lado, sofre também a pessoa jurídica limitações impostas pela norma, mesmo no campo patrimonial, tendo em vista razões de ordem pública. Devemos entender, pois, as limitações à capacidade da pessoa jurídica dentro dessas impostas por sua própria condição.
Decorre daí que, enquanto a capacidade da pessoa natural pode ser ilimitada e irrestrita, a capacidade da pessoa jurídica é sempre limitada a sua própria órbita. Essa limitação não pode ser tal que nulifique as finalidades para as quais a pessoa foi criada, nem ser encarada de forma a fixar-se a atividade da pessoa jurídica apenas para sua finalidade. Vezes há em que a pessoa jurídica, ao agir, extravasa seus ordenamentos internos, sem que com isso seus atos possam ser tidos como ineficazes. Para considerá-los como tal, é necessário o exame de cada caso concreto, sem se olvidar que a pessoa jurídica também possui uma capacidade genérica.
Sob o aspecto do exercício dos direitos é que ressalta a diferença com as pessoas naturais. Não podendo a pessoa jurídica agir senão através do homem, denominador comum de todas as coisas no Direito, esse ente corporificado pela norma deve, em cada caso, manifestar-se pela vontade transmitida por alguém.
A tal respeito dizia o art. 17 do Código Civil anterior que "as pessoas jurídicas serão representadas, ativa e passivamente, nos atos judiciais e extrajudiciais, por quem os respectivos estatutos designarem, ou, não o designando, pelos seus diretores". O atual Código estatui que, "se a pessoa jurídica tiver administração coletiva, as decisões se tomarão por maioria de votos dos presentes, salvo se o ato constitutivo dispuser de modo diverso" (art. 48).
A base jurídica da pessoa jurídica em sua ordem interna será sempre seu ato constitutivo, seus estatutos ou contrato social. Quando estes não contrariarem norma de ordem pública, prevalecerá sobre os dispositivos legais em prol da autonomia da vontade. Assim também devem ser vistos os dispositivos presentes no vigente Código.
O CPC estatui que os entes de direito público, isto é, União, Estados e Territórios, serão representados por seus procuradores, e o Município, pelo Prefeito ou procurador (art. 12, I e II). Há, portanto, uma vontade humana que opera na pessoa jurídica, condicionada a suas finalidades.
Não se há de fazer, contudo, analogia entre a representação dos incapazes com a chamada representação da pessoa jurídica. Isso porque a representação dos incapazes (alienados mentais, surdos-mudos, menores etc.) ocorre quando há incapacidade, exigindo, assim, proteção e suprimentos legais. Na chamada representação das pessoas jurídicas, o que se intenta é provê-las de vozes que por elas possam falar, agir e praticar os atos da vida civil. Há, pois, na pessoa jurídica, mais propriamente uma presentação, algo de originário na atividade dos chamados representantes, do que propriamente uma "representação".
A pessoa jurídica presenta-se (ou se apresenta) perante os atos jurídicos, e não se representa, como ordinariamente se diz.
Por isso, hoje há tendência de substituir o termo representante da pessoa jurídica, como ainda temos no Código Civil, terminologia que é mantida pelo atual Código, pelo vocábulo órgão, levando-se em consideração que a pessoa natural não é mero porta-voz da pessoa jurídica, nem simples intermediária de sua vontade. Na realidade, nem sempre a vontade do diretor ou administrador que se manifesta pela pessoa jurídica coincide com sua própria vontade. Ele é apenas um instrumento ou "órgão" da pessoa jurídica, entendendo-se, assim, que há duas vontades que não se confundem. A vontade da pessoa jurídica é autônoma, como decorrência de seu próprio conceito.
Apenas impropriamente, portanto, e por respeito à tradição e ao Direito positivo fala-se em "representação" da pessoa jurídica (Pereira, 1978, v. 1:271).


Bibliografia:
GAGLIANO, Pablo Stolze.; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, volume I : parte geral. 8. ed. rev. atual. e reform. São Paulo: Saraiva, 2006. 498p.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito civil: teoria geral. 6. ed Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. 683p
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 11. ed. atual Sao Paulo: Saraiva, 1997.
GONCALVES, Carlos Roberto. Direito civil: parte geral. 8. ed Sao Paulo: Saraiva, 2000
PEREIRA, Caio Mario da Silva. Direito civil : alguns aspectos da sua evolucao. Rio de Janeiro: Forense, 2001. 322p
 


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